25 setembro 2005

Luta por um Pólo Audiovisual em JF


Produtores apresentam hoje projetos de financiamento à produção de cinema de JF
Produtores locais participam de reunião hoje na Câmara Municipal para apresentar projetos de financiamento à produção de cinema na cidade e levantam discussão sobre o Pólo Audiovisual de Juiz de Fora.
Com o pires na mão
Ao contrário do mercado fonográfico, o cinema brasileiro vai bem, equilibrando-se entre sucessos comerciais incontestáveis, caso de "A partilha", com mais de 1,3 milhão de pagantes, e produtos que primam pelo caráter eminentemente artístico, como "Bicho de sete cabeças", "Lavoura arcaica" e "Abril despedaçado" (fortes títulos a representarem o Brasil na corrida pelo Oscar), e exemplos de entretenimento de qualidade, como "O Xangô de Baker Street". Enquanto as perspectivas melhoram com a criação da Agência de Cinema Brasileiro, produtores de curtas-metragens de Juiz de Fora vão à Câmara Municipal esta tarde apresentar um projeto para viabilizar a realização de cinema na cidade, ou, traduzindo em português claro, tentar garantir apoio financeiro para a produção de filmes às margens do Paraibuna.

"Vivemos uma estagnação da produção cinematográfica local, já que a Lei Murilo Mendes (Lei MM) só agraciou projetos em vídeo em sua última edição", critica o produtor Franco Groia, único vencedor do primeiro Prêmio de Curtas-Metragens do Pólo Audiovisual de Juiz de Fora a ter seu filme concluído e exibido. "O cinema da cidade não pode depender disso, pois precisa ter uma política especial de produção". Junto de outros produtores, ele defende a criação de um órgão gestor municipal para cinema, com autonomia para fiscalizar a inadimplência em relação à captação de recursos. "Temos que pensar profissionalmente e perceber a necessidade de parâmentros orçamentários diferentes para a produção de vídeo e a cinematográfica".
Para Rogério Terra Júnior, o grande problema é a falta de recursos, pois a exibição local é garantida com o apoio do Cinearte Palace, através do Projeto "Curta Petrobras às Seis", e da apresentação dos curtas antes do filme principal, modelo historicamente pouco funcional. "Temos que ampliar o debate, discutindo a produção audiovisual, buscando parcerias com a TV a cabo. Ninguém faz cinema sem pensar nas mídias eletrônicas", afirma ele, que teve seu filme "Sob a sombra dos anjos" exibido em todo o país em festivais de cinema e na televisão. "O poder público municipal tem que entender o audiovisual como uma indústria que atrai impostos e gera divisas para a cidade, daí a idéia de criar uma lei específica garantindo seu funcionamento."
Ao invés de ficar de braços cruzados enquanto não consegue dinheiro para fazer seu próximo curta em película, Terra Júnior usa o vídeo para realizar sua criação. O documentário "A vida além do arco-íris" mostra a transformação de Juiz de Fora, de uma cidade provinciana num ponto de encontro de liberdade da orientação sexual, com o Miss Brasil Gay. As imagens feitas no Calçadão durante o terceiro sábado de agosto servem como pano de fundo para os depoimentos de André Luís Santos e Fernanda Müller sobre a descoberta e a afirmação da identidade homossexual. A estréia do filme, exibido com o vídeo experimental "Madalena, flores de plástico, coração de fogo" e com o curta "Sob a sombra dos anjos", será hoje à noite no Movimento Gay Minas (MGM).
Política de médio e longo prazo
Para o assesor da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico (SMDE), Luis Fernando Taranto, a abertura de novas salas de cinema na cidade é uma prova de que o Pólo Audiovisual de Juiz de Fora funciona, atraindo a atenção de empresas exibidoras, sendo que este mercado deve sofrer um aquecimento com a implantação dos canais locais de TV a cabo. "A Prefeitura não tem recursos para garantir a produção de curtas, sendo que, nos dois concursos a PJF e a UFJF entraram com 60% dos custos de produção", comenta ele. "A política não pode ser "venha a nós tudo e ao vosso reino nada". Taranto afirma que solicitou ao deputado federal Paulo Delgado o encaminhamento de uma emenda ao orçamento de R$ 120 mil, a serem usados na implantação de uma "oficina de cinema", criando uma logística para facilitar a produção local.
Levando o debate sobre a produção audiovisual para além dos limites da cidade, Taranto critica a posição dos produtores. "Produzir cinema não é só investimento do poder público", alfineta. "O que não dá é ficar parado em casa, esperando o dinheiro cair no colo para começar a trabalhar". Na opinião do assessor da SMDE, a saída dos produtores locais pode estar em concorrer com seus projetos aos prêmios de incentivo federal e estadual. "Estamos conseguindo formar um público para o cinema brasileiro através da exibição dos curtas no Cinearte Palace", diz, defendendo o Pólo. "As pessoas não vêem que essa é uma política feita a médio e longo prazo."
'Não há Pólo Audiovisual na cidade'
"A grande verdade é que não há Pólo Audiovisual na cidade. O que existe são pessoas desejosas e fazedoras de cinema que tentam transformar seus projetos em realidade", assim respondeu Alexei Divino, diretor do curta "Deus me livre", cuja estréia acontece no grande teatro do Palácio das Artes, em Belo Horizonte, no dia 1º de novembro. Realizado com R$ 60 mil, através do prêmio Estímulo concedido pela Associação Curta Minas com patrocínio da Cemig, a produção foi toda rodada em Juiz de Fora. "Não recebi qualquer apoio da cidade, mas fiz questão de trabalhar com técnicos e artistas daqui", conta ele, defendendo a criação de um prêmio para estimular a produção, desde que o processo seja absolutamente transparente.
A falta de limites que a arte cinematográfica encontra é o principal ponto destacado pelo diretor. "Não sou contra investimento em literatura, artes plásticas ou em outras coisas, mas o cinema consegue dar uma visibilidade maior a todo tipo de atividade artística feita na cidade, pois conta com músicos, cenógrafos, atores, figurinistas, designer gráfico, jornalista e outros profissionais cujo trabalho passa a ser conhecido em vários lugares", alega ele, que ainda cuidou da produção de quatro vencedores do primeiro prêmio dado pelo Polo Audiovisual local para estimular a produção de curtas. "Não adianta dar um prêmio e parar tudo."
Filmados há mais de dois anos, os "4 curtas juizforanos" permanecem inéditos e devem continuar nessa situação por um período indeterminado. O documentário "O que a feira livre tem?", de Marquinhos Pimentel, e a comédia de terror "Um dia na vida de Roberto Danúbio", de Alexis Parrot, estão montados, faltando apenas a mixagem de som e o processo de laboratório, cujos custos são de R$ 5 mil para cada. Por problemas na captação de som durante a filmagem, a situação de "O dono da rua", de Fred Antunes, e "A primeira transa de Cláudia", de Tairone Vale, é ainda mais complicada, pois as duas produções ainda devem passar pelo processo de telecinagem antes de serem editados em AVID, sistema em que os defeitos de som podem ser ajustados.
Vivendo de realidade
Como a produção de audiovisual na cidade é incipiente, talentos de Juiz de Fora migram para outras cidades em busca de trabalho. Depois de passar o ano 2000 dirigindo comerciais de TV, Alexis Parrot se mudou para Belo Horizonte, onde desenvolve projetos para a TV Alterosa. "Sem dinheiro não se faz cinema", resume ele, sugerindo um aumento nos recursos da Lei MM, que passaria a incentivar a produção de audiovisual (vídeo e cinema) sistematicamente.
"Em Juiz de Fora, há gente com capacidade e experiência para trabalhar nessa área. O negócio é aprimorar as leis de incentivo e não criar mecanismos específicos para garantir recursos". Depois de trabalhar com José Sette na produção de "O rei do samba", Marquinhos Pimentel também foi para a capital mineira trabalhar na Rede Minas. "Se continuar assim, a criação de uma indústria cinematográfica em Juiz de Fora não passará de utopia." Parece frase de candidato da oposição, mas não deixa de resumir o sentimento de quem trabalha no setor audiovisual da cidade.
(Jornal "Tribuna de Minas", dia 24 de outubro de 2001)

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