02 setembro 2007

Cinema em foco - À espera de um filme

Os juizforanos poderão assistir, ao mesmo tempo que o resto do país, o nacional "Cidade dos homens", que chega hoje às salas de todo o Brasil. No entanto, terão que esperar mais um pouco para conhecer a última produção do diretor Daniel Filho, “Primo Basílio”, que estreou em 24 de agosto e está previsto para aportar por aqui apenas na próxima semana. Mas atrasos e ausência de bons lançamentos não são novidade para os amantes da sétima arte da cidade. “Saneamento básico”, “O cheiro do ralo”, “Babel”, “Déja vu”, “A rainha” e “Dream girls - Em busca do sonho” chegaram por aqui 30 dias depois de estrearem nas principais salas do país. Longe de exageros, “Apocalypto” e “Borat” superaram um mês de atraso, só ficando à frente de “O último rei da Escócia” e “O bom pastor”, que estrearam em Juiz de Fora 90 dias depois, enquanto que os estrangeiros “Pecados íntimos” e “Cartas de Iwo Jima” e os brasileiros “Cão sem dono” e “500 almas” nem deram o ar da graça por aqui. Exibidores e distribuidores não conseguem chegar a um acordo em relação aos motivos desse descompasso. A falta de cópias é o argumento dos donos de cinemas, contestado pelos distribuidores, que alegam desinteresse destes por filmes que não tenham bilheteria garantida.
As estudantes Raquel Ribeiro, 14, Luara Herédia, 15, e Nayelle Sales, 16, lamentam que o “Primo Basílio” esteja demorando tanto para entrar no circuito juizforano, acreditando “não haver, aqui, salas suficientes para atender o mercado nacional e internacional”. Em 2004, a jornalista Adriana Abrantes, 27, saiu de Juiz de Fora rumo a Belo Horizonte para ver o filme “Em carne viva”. “Era um filme que eu queria muito ver no cinema, com a magia que o DVD não tem”, lembra. Esse ano, mais uma frustração para Adriana, que esperou por “Maria Antonieta”, que estava, inclusive, entre os indicados ao Oscar, e nada.
Entre as distribuidoras e as salas de exibição
Segundo especialistas, o foco do problema está na ditadura econômica, na qual distribuidoras e salas de projeção se encontram submetidas. “Aqui no Brasil, 85% das salas são dominadas por filmes comerciais como ‘Homem-aranha’ e ‘Os Simpsons’, restando somente 15% para a produção nacional ou filmes de arte e documentários”, comenta o cineasta Marcos Pimentel, que acredita ainda que o problema se agrava na medida em que não sobra verba para publicidade da produção nacional, dificultando o lançamento em muitas praças. De acordo com o cineasta Rogério Terra, são produzidos cerca de 50 filmes de qualidade por ano no Brasil, “com quesitos que agradam o apelo popular”. Mas ainda assim predomina-se a hegemonia do “cinema pipoca”, ou seja, as grandes produções americanas. “Não é mais justificativa dizer que o Brasil não produz cinema de qualidade. Há, ainda, certo preconceito com relação a alguns filmes”, completa.
Cópias insuficientes ou falta de interesse
O consenso é em relação às distribuidoras, que “produzem um número insuficiente de cópias”, como afirma o professor de cinema Nilson Alvarenga. No entanto, ações como a “cota de tela”, da Agência Nacional do Cinema (Ancine), que estipula a exibição de cerca de 30 filmes nacionais, ao longo do ano, em todos os cinemas, não são suficientes para abraçar o enorme volume de produções brasileiras. “É muito pouco para esses filmes que contam com a divulgação boca-a-boca”, conclui Marcos Pimentel. O fundador do grupo de cinéfilos Luzes da Cidade, Paulo Campos, também deposita sua esperança em uma maior divulgação das produções nacionais e/ou alternativas, apontando que entre dez pessoas, sete não querem alugar lançamentos brasileiros por não conhecerem o produto.
Na mesma trilha, o diretor de programação do grupo Cinearte Palace (SP), Ademar Oliveira, revela que, para um filme chegar, ao mesmo tempo, nas principais cidades brasileiras, e isso inclui as de porte médio como Juiz de Fora, deveria ter 400 cópias. O gerente do Duocine Santa Cruz, Marcelo Magalhães, e a subgerente do Moviecom Alameda, Adriana Cecília de Paula, completam afirmando dependerem da disponibilidade da distribuidora, que “sempre opta por atender primeiro aos grandes centros, para depois alugar as cópias para o interior”. Questionada sobre o esperado e indicado ao Oscar “Cartas de Iwo Jima”, Adriana confessou que o longa foi oferecido a ela, mas a demora fez com que o longa perdesse a concorrência para obras mais modernas. “Na época, eu já tinha outros lançamentos mais interessantes e novos para ocupar as salas”, argumenta.
O gerente de programação da Rio Filmes, Airton Correia, garante que os cinemas juizforanos é que não se interessam por alguns filmes. “’Brasileirinho’ e ‘500 almas’ são exemplos de produtos que nós colocamos à disposição de Juiz de Fora e até agora nenhuma das salas se interessou. O número de cópias não é o problema se não temos espaço para entrar”, se defende. Segundo ele, na hora de escolher, o exibidor, sobretudo aquele com poucas salas, opta pelos blockbusters, produtos de maior rentabilidade. Para driblar o “jogo de mercado”, que empata a relação distribuidora e exibidora, o professor de produção audiovisual Franco Gróia contesta Airton Correia afirmando que a oferta é muito pequena. Além disso, Gróia aponta caminhos capazes de fomentar o contato entre os exibidores e o público. “O foco é a questão do gosto. O que os espectadores gostam? Qual é o perfil do público hoje?”. As perguntas, para ele, podem ser respondidas com uma criteriosa e permanente pesquisa, que, a médio prazo, vai determinar o que a população irá consumir.
Conforme dados da distribuidora Columbia Tristar (SP), foram feitas 58 cópias de “Saneamento básico” e 163 de “Primo Basílio”. Números muito pequenos se compararmos com as 402 cópias de “Os Simpsons”, as 450 de “Harry Potter” e as 600 de “Homem-aranha 3”. Muita discrepância? Não para os distribuidores, que, para mapear a disponibilização das películas, realizam uma estimativa sobre o potencial do produto, com a “finalidade única de não gerar prejuízos para a mesma”. É o que relata o programador da Columbia, Waldomiro de Barros, que ainda vai além. “Com base em nossa experiência é que ditamos quantas cópias serão feitas de cada filme e onde alugaremos primeiro, porque se você faz uma abertura grande para um produto médio, você perde dinheiro”, explica.
(Fonte: TM de 31 de agosto de 2007)