04 junho 2006

Na real

Documentário

Os avanços tecnológicos trouxeram inúmeras vantagens aos artistas, principalmente no cinema. Se muitos ainda preferem a película (mais cara e mais trabalhosa), muitos outros dedicam-se a descobrir as maravilhas que o formato digital, mesmo com menor qualidade de imagem, proporciona em praticidade, logística e, principalmente, despesas. Em meio a esta configuração, o documentário emerge como a atual mania do audiovisual. Seja pela influência de casos bem-sucedidos, como os de Michael Moore (que ganhou Cannes e o Oscar), Eduardo Coutinho, João Moreira Salles, Wim Wenders, José Padilha e, recentemente, MV Bill, seja pela overdose de produções blockbuster, é perceptível que o interesse dos jovens cineastas têm se voltado para a possibilidade de capturar a realidade, in loco, com uma estética menos maquiada.

Mas, se diretores de ficção já encontram dificuldades na produção e, principalmente, na distribuição e divulgação de seus trabalhos, os documentaristas ainda lutam para conquistar seu lugar ao sol. Porém, pouco a pouco, os editais públicos passam a focar o formato, e festivais aparecem no país (ver quadro). “Infelizmente, os editais ainda são o único caminho, apesar de ter aumentado o interesse por parte dos canais de TV fechada”, ressalta o juizforano Marcos Pimentel, que já rodou 19 documentários. “O processo de formação do público também é lento, mas, graças a pessoas como Coutinho e Salles, o público vai se acostumando. Eles têm distribuição pela VideoFilmes e pela Conspiração, mas, por enquanto, a maioria de nós fica de fora do circuito comercial, restrita a festivais.”
Em Juiz de Fora, a recém-aberta Groia Filmes, produtora do cineasta Franco Groia, vem tentando criar espaço para produções de cunho não-comercial. “No início é sempre complicado, mas a cidade tem muita produção audiovisual e muita gente interessada em documentário. Percebemos isso com o oficina que organizamos com o Marcos Pimentel, que teve muita procura”, conta a produtora Flávia Lima.

Ainda que existam muitas produções puxadas para o lado político-social do Brasil, vide “Falcões - meninos do tráfico”, de MV Bill e Celso Athayde, existem aqueles atentos ao dia-a-dia e aos detalhes que nos escapam. Seja como for, o estilo documental proporciona uma liberdade no olhar que garante ao telespectador o contato com uma obra inevitavelmente pessoal. No entanto, poucos são os que conseguem viver somente de sua produção autoral, e a maioria precisa trabalhar em projetos paralelos.O diretor de fotografia juizforano, Cleisson Vidal, que apresentou o documentário “Missionários” na última edição do Festival Primeiro Plano, trabalha como freelancer no Rio e em São Paulo. “Documentário no Brasil é para poucos. O próprio Coutinho ficou 15 anos sem filmar. O problema da distribuição é estrutural e ninguém pretende mexer na engrenagem da indústria cinematográfica. É uma dinâmica perversa que não sei ao certo como reverter, mas a TV, a Internet banda-larga e as salas de cinema com projeção digital podem ser uma saída”, avalia o documentarista.

Flerte com o jornalismo
“De quatro anos para cá, houve um aumento na produção, na visibilidade e também na bibliografia sobre documentário. Há dez anos, você encontrava pouquíssimos livros sobre o assunto, mas, desde então, o crescimento tem sido constante”, avalia o professor da Faculdade de Comunicação da UFJF (Facom), mestre em Multimeios pela Unicamp, Cristiano Rodrigues. De fato, o maior festival do estilo no país, o É Tudo Verdade, incluiu, há alguns anos, um fórum de discussão em sua programação. Neste caso, além de apresentação e competição de documentários, diversas pessoas da área são convidadas a discutir diferentes aspectos do mercado e da criação. “As faculdades de jornalismo estavam precisando desta ponte com o cinema, e o documentário acrescenta muito ao jornalista. Vejo que os alunos estão interessados por temas mais humanizados e olhares mais sinceros”, completa Cristiano.

Um grupo de alunos da Facom se identificou com esta proposta e, sob orientação do professor, realizou o documentário “Conquista”, como trabalho de conclusão de curso. Durante um mês, eles acompanharam a rotina de um assentamento do MST, no Sul do país. “Vejo que fomos muito influenciados pelo Coutinho, baseando o filme muito em cima da fala. Hoje, percebo que posso ser mais subjetiva e dar atenção ao entorno”, diz Flávia Vilela, produtora do documentário, que participou da oficina de Pimentel. “Sempre gostei de cinema, mas nunca tive idéias para roteiros de ficção. Prefiro observar. Acho que é uma forma de jornalismo mais sincero, em que não precisamos ser imparciais e temos ponto de vista e olhar explícitos.”

Como tudo que se banaliza, ainda existe desproporção entre a produção documental e a qualidade do material. Vidal defende que, apesar das dificuldades com divulgação e do crescimento abrupto do número de produções, a competência do trabalho ainda é o melhor atrativo para o espectador. Para Pimentel, a principal conseqüência deste “boom” é a falta de preparo dos realizadores. “Você não tem que ensaiar, preparar cenário, maquiar: é só montar a câmera e filmar. E, justamente porque não costuma existir roteiro em um primeiro momento, é preciso estar com um conceito muito claro e não deixar para descobrir qual é sua história ao final das filmagens. O filme é você quem faz, não o acaso.”

Fique por dentro
Financiamento
- Documenta Brasil (SBT): R$ 550 mil. Inscrições abertas até 26 de junho
- DocTV III: R$ 100 mil. Inscrições encerradas
- DocTV Ibero-América: US$ 100 mil. Inscrições encerradas dia 31
- Rumos Itaú Cultural: R$ 100 mil. Inscrições encerradas
Festivais
- É tudo verdade
- Festival do Filme Documentário e do Filme Etnográfico (ForumDoc BH)
- Mostra Internacional do Filme Etnográfico


(Jornal Tribuna de Minas - Juiz de Fora, quarta-feira, 04 de junho de 2006)

Justiça determina que Caixa indenize correntista

Um correntista bancário de Juiz de Fora conquistou mais uma vez na Justiça uma indenização por danos morais, em virtude da falta de acessibilidade aos portadores de deficiência física nos terminais bancários de auto-atendimento.

A ação está tramitando na 3ª Vara da Justiça Federal e foi impetrada pelo cineasta Franco Groia contra a Caixa Econômica Federal. A juíza Sílvia Elena Petry Wieser concedeu a indenização de R$ 1 mil ao cineasta e deu prazo de 30 dias para o banco providenciar um equipamento adaptado para deficientes em seus terminais. Caso isso não aconteça, a multa será de R$ 500 para cada dia que o banco descumprir a ordem judicial. A decisão, no entanto, pode ser questionada em recurso.

Segundo Groia, o resultado é positivo, já que pode beneficiar um grande grupo de pessoas. Ele considera, no entanto, a indenização muito pequena. “Este valor não afeta a Caixa Econômica em nada. Parece piada. Vamos requerer um aditivo.” No ano passado, o cineasta ganhou uma ação contra o Bradesco. Na ocasião, além da multa diária - que foi semelhante - foi fixada indenização de R$ 5 mil.

Necessidades especiais
A base da ação é a falta de condições de acesso e operacionalização para os portadores de necessidades especiais. A assessoria da Caixa informou que o banco ainda não teve acesso a todo o conteúdo da sentença e que por isso não vai se pronunciar sobre o caso. O valor originalmente requerido por Groia é de cem salários mínimos - o equivalente hoje a R$ 35 mil.

(Jornal Tribuna de Minas - Juiz de Fora, quarta-feira, 24 de maio de 2006)

Longo caminho para a democratização

CONSELHO MUNICIPAL DE CULTURA

A Câmara apresentou ontem à classe artística de Juiz de Fora a proposta de lei para criação do Conselho Municipal de Cultura formulada pela Prefeitura. Em audiência pública, membros do poder público, produtores e representantes de entidades culturais, além de vereadores, discutiram o projeto, que gerou muitos pontos polêmicos, como a paridade e o poder deliberativo do conselho.

Segundo proposta do prefeito Alberto Bejani, dos 31 membros sugeridos para compor o grupo, dois terços seriam do poder executivo e os demais, da sociedade civil, representando diferentes entidades culturais da cidade. Além disso, o conselho teria poder apenas consultivo. “Este órgão deve ser a instância máxima da política cultural do município e tem que estar acima de divergências partidárias”, reivindicou o jornalista e produtor cultural Jorge Sanglard, ressaltando a importância de que o processo de formação do conselho seja “o mais democrático possível”. Para o presidente da Fundação Museu Mariano Procópio (Mapro), Francisco Antônio de Mello Reis, a necessidade deste conselho é inegável, e ele já deveria existir há muito tempo. “Meu medo, entretanto, é que ele se torne apenas um órgão burocrático para recolher assinaturas que viabilizem o funcionamento das instituições. Não podemos deixar isso acontecer”, afirmou.

Diante das reivindicações unânimes da classe artística para que fosse aprofundada a discussão, o vereador do PT, Flávio Cheker, convocou nova audiência, desta vez convidando todos os produtores culturais. “As sugestões de alteração do projeto devem ser encaminhadas à Comissão de Educação e Cultura da Câmara, para depois serem recolhidas, avaliadas e apresentadas as emendas”, informou o vereador. Quanto aos membros integrantes deste conselho, nada foi decidido. “Não é só a produção que está em jogo aqui, mas também a gestão, a distribuição e a visibilidade da cultura da cidade. O Sistema Nacional de Cultura vai aumentar e garantir a chegada de capital ao nosso Fundo Municipal”, diz o cineasta Franco Groia, lembrando que o sistema de conselhos vem funcionando há alguns anos em cidades como Recife, Florianópolis e Porto Alegre, o que serviu de inspiração para a atual diretriz federal.

(Jornal Tribuna de Minas - Juiz de Fora, quarta-feira, 24 de maio de 2006)

Projetos de cinema se misturam com projetos de vida

Juiz de Fora é um berço de talentos. O cineasta Franco Groia, profissional já conceituado na área e sócio da Groia Filmes, está com vários projetos para 2006 e conversou com “eMiolo” sobre cinema, política e suas atuações na área social. Confira:

Você cursou Comunicação Social na UFJF. O interesse pelo cinema começou nessa época?

Não exatamente. Meu interesse sempre foi o cinema desde pequeno, afinal sempre vivi em torno do cinema através de idas freqüentes ao cinema e na infância sempre tive o hábito de freqüentar o Cine Excelsior. Quando fiz vestibular pela primeira vez foi a época tenebrosa da Era Collor, que deixou o cinema brasileiro na estaca zero no início da década de 90. Nesta época optei por fazer Comunicação Social com habilitação em Rádio e TV, sendo meu interesse pela produção mais voltada para a área de TV. Como nada é por acaso, tive a sorte de ter contato com o cinema propriamente dito ao final do curso quando fui fazer cursos específicos na área, através do FAT, promovido pela Prefeitura de JF, a UFJF e o Governo Federal. Acabei me graduando em Comunicação Social e logo em seguida fui trabalhar com cinema.

Há alguns anos, o mercado cinematográfico em Juiz de Fora tinha menos visibilidade que atualmente. Como é fazer cinema na cidade?

Muita coisa tem mudado: hoje temos um curso de graduação efetivamente operando em JF, formando uma turma a cada semestre (no qual eu também leciono); temos uma Lei Municipal de Incentivo a Cultura exemplar, que fomenta não só outras áreas da cultura como também o cinema da cidade; conseguimos estabelecer um grande evento nacional de cinema anualmente na cidade, que é o Festival Primeiro Plano; e procuramos constantemente trabalhar na consolidação de um fluxo produtivo de filmes Juizforanos através de nossa produtora, a Groia Filmes, que produz não só filmes como propagandas e diversos eventos culturais.

A Groia Filmes está no mercado desde 1999. Entretanto, ainda existem pessoas que acreditam que é melhor trabalhar em lugares como RJ e SP. O que você acha disso? Já quis sair daqui?

Não acredito que sair da cidade seria a real solução para qualquer pessoa. Meu real interesse é ir na contra-mão deste senso comum, pois acredito no potencial de Juiz de Fora e o meu grande barato, assim como de diversas pessoas que optaram em permanecer na cidade é lutar para construir uma história real e permanente de produção cinematográfica de Juiz de Fora.

Você foi candidato a vereador pelo PT em 2004. Tem planos de se candidatar novamente? O que está achando da atual administração?

Não sei dizer hoje se vou me candidatar novamente. Hoje a conjuntura é bem diferente daquela de dois anos atrás e a vida pública necessita realmente de dedicação quase que diária. Continuo filiado ao PT Municipal. Naquela ocasião, a área da cultura não tinha nomes que a representassem na Câmara Municipal, e hoje a classe já está mais organizada e acredito ser capaz de lançar seus próprios nomes e direcionar uma política cultural para nosso município. Particularmente, enquanto cidadão foi uma experiência muito gratificante de exercício pleno de cidadania e acredito ter sido uma grande experiência pessoal ter vivido todo o processo eleitoral naquele ano. Até porque todo o discurso que se tem em volta da democracia e inclusão social percebi que é mera retórica, pois não tive a mesma possibilidade de visibilidade do que outros candidatos, não só do ponto de vista econômico, como também de acesso a comícios e afins, haja vista que a Justiça Eleitoral não garante nem fiscaliza as regras de igualdade entre os candidatos. Apesar de tudo isso, agradeço a todos aqueles que acreditaram na nossa bandeira, afinal foram 730 votos numa primeira incursão eleitoral.

Você já moveu uma ação para que um banco se adaptasse às suas (e de muitos outros) condições físicas e obteve sucesso. Como você analisa a imagem que a sociedade tem do deficiente? Está envolvido em algum projeto social?
A sociedade de um modo geral nunca viu o deficiente como um igual, capaz de viver uma vida normal, apesar de suas limitações e, sobretudo, estar incluído dentro do que entendemos ser o segmento economicamente ativo da sociedade. Temos que deixar de lado aquela idéia paternalista do deficiente enclausurado em seu lar, incapaz de se relacionar e ter uma vida normal. Hoje me envolvo com alguns movimentos sociais. Apoio iniciativas comunitárias que acreditam no potencial da cultura enquanto ferramenta de transformação social.
Você está filmando, ou tem planos de iniciar a produção de algum curta no momento?

Atualmente estamos em várias produções e o que posso adiantar é que está em fase final de produção meu último filme, intitulado “Chave”, e estamos produzindo o curta metragem “Condenado”, de Bernardo Falcão, e iniciamos a produção do longa metragem “Lanterna Mágica”, de Alexandre Alvarenga.

E o Festival Primeiro Plano? Será realizado esse ano? Terá apoio de alguma lei, empresa ou fundação?

Certamente, acredito, que o festival terá a sua edição 2006 realizada normalmente. Acredito também que as empresas da cidade venham a patrocinar o evento através das Leis de Incentivo a Cultura e possam proporcionar ao povo de Juiz de Fora mais um grande evento para a cidade.

Qual dica você dá para os novos cineastas que estão surgindo em Juiz de Fora?

Serenidade, perseverança e, sobretudo disposição para entrar realmente no mercado cinematográfico. Uma boa dica também é assistir a um filme diariamente.

Fonte: www.emiolo.com - publicada no site dia 12 de maio de 2006